Opinião
Literacia financeira dos jovens portugueses: uma urgência nacional no contexto europeu
João Santos 21/03/2025
Introdução
A literacia financeira é, hoje mais do que nunca, uma
competência essencial para a vida. Num mundo marcado pela complexidade dos mercados
financeiros, pela digitalização das transações e pela crescente oferta de produtos de
crédito
e investimento, os jovens enfrentam desafios que exigem conhecimento, discernimento e
preparação. No entanto, em Portugal, a realidade é preocupante: os jovens portugueses
estão
significativamente atrás dos seus pares europeus no que diz respeito à compreensão de
conceitos financeiros básicos. Esta discrepância não é apenas um problema educativo; é
uma
questão social e económica que exige ação imediata.
O retrato da literacia financeira em
Portugal
Os dados não deixam margem para dúvidas. Segundo o
último
relatório do “Programme for International Student Assessment” (PISA), que avalia a
literacia financeira de jovens de 15 anos, Portugal situa-se abaixo da média da
Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). Enquanto países como a Finlândia,
a
Holanda e a Estónia lideram o ranking, com jovens que demonstram um entendimento sólido
de
conceitos como poupança, investimento, taxas de juro e gestão de dívidas, os jovens
portugueses revelam dificuldades alarmantes.
Este cenário reflete, em grande parte, a falta de
prioridade
dada à educação financeira no sistema educativo português. Enquanto noutros países a
literacia
financeira é integrada nos currículos escolares desde cedo, em Portugal este tema ainda
é
tratado de forma marginal, quando é tratado. Além disso, a cultura portuguesa tende a
evitar
discussões sobre dinheiro no seio familiar, o que limita a exposição dos jovens a
conceitos
financeiros básicos.
As consequências da ignorância
financeira
A falta de literacia financeira tem impactos profundos e
duradouros. Jovens que não compreendem os princípios básicos da gestão do dinheiro estão
mais
vulneráveis a uma série de riscos:
- Endividamento excessivo: Sem compreender as implicações de taxas de juro elevadas ou os perigos do crédito fácil, muitos jovens acabam por contrair dívidas que os acompanham durante anos, comprometendo o seu futuro financeiro.
- Exclusão financeira: A incapacidade de entender produtos financeiros básicos, como contas bancárias ou seguros, pode levar à exclusão financeira, limitando o acesso a serviços essenciais e oportunidades de crescimento.
- Vulnerabilidade a fraudes: Num mundo cada vez mais digital, os jovens são alvos fáceis para esquemas fraudulentos, como investimentos falsos ou ofertas de crédito predatórias. A falta de conhecimento financeiro aumenta o risco de cair nestas armadilhas.
- Impacto no bem-estar individual e coletivo: A instabilidade financeira não afeta apenas os indivíduos; tem repercussões na economia nacional. Jovens endividados e financeiramente instáveis contribuem menos para o crescimento económico e estão mais dependentes de apoios sociais.
O caminho que temos de percorrer: uma estratégia
nacional para a literacia financeira
Resolver este problema exige um esforço concertado e uma
estratégia de longo prazo. Não se trata apenas de ensinar conceitos financeiros;
trata-se de
capacitar os jovens para tomarem decisões informadas e responsáveis. Aqui estão algumas
medidas que podem fazer a diferença:
- Integração da Educação Financeira no Sistema Educativo: A literacia financeira deve ser uma disciplina obrigatória desde o ensino básico. Países como a Estónia e a Finlândia já demonstraram os benefícios desta abordagem, com jovens que apresentam níveis elevados de compreensão financeira. Portugal deve seguir este exemplo, adaptando os conteúdos à realidade nacional e garantindo que os alunos saem da escola com competências práticas, como elaborar um orçamento, entender uma fatura de eletricidade ou comparar produtos de crédito.
- Formação de Professores e Desenvolvimento de Materiais Didáticos: Para ensinar literacia financeira, é essencial que os professores estejam bem preparados. Programas de formação contínua devem ser implementados, e materiais didáticos de qualidade devem ser desenvolvidos, com exemplos práticos e linguagem acessível.
- Campanhas de Sensibilização Pública: A literacia financeira não deve ser limitada às salas de aula. Campanhas de sensibilização dirigidas aos jovens e às suas famílias podem ajudar a desmistificar o tema das finanças pessoais. Parcerias com instituições financeiras, meios de comunicação e influencers podem amplificar esta mensagem e chegar a um público mais vasto.
- Utilização de Tecnologia e Gamificação: A tecnologia pode ser uma aliada poderosa na promoção da literacia financeira. Aplicações móveis, jogos educativos e plataformas digitais podem tornar o aprendizado mais acessível e envolvente. Por exemplo, simuladores de investimento ou jogos de gestão de orçamentos podem ajudar os jovens a aprender de forma prática e divertida.
- Envolvimento das Famílias e da Comunidade: As famílias têm um papel crucial na educação financeira dos jovens. Promover workshops e recursos para pais e encarregados de educação pode ajudar a criar um ambiente doméstico onde o dinheiro seja discutido de forma aberta e construtiva. Além disso, as autarquias e associações locais podem organizar iniciativas comunitárias, como feiras de educação financeira ou palestras com especialistas.
- Colaboração com o Setor Financeiro: As instituições financeiras têm um papel a desempenhar na promoção da literacia financeira. Programas de responsabilidade social que incluam workshops, materiais educativos e parcerias com escolas podem ajudar a preencher esta lacuna.
Conclusão: um imperativo nacional
A literacia financeira dos jovens portugueses não é
apenas uma
questão educativa; é um imperativo nacional. Num mundo cada vez mais complexo e
competitivo,
não podemos permitir que os nossos jovens fiquem para trás. A discrepância em relação
aos
outros países da União Europeia é um sinal de alerta que não podemos ignorar.
Investir na literacia financeira é investir no futuro do
país.
Jovens financeiramente informados estão mais preparados para enfrentar os desafios
económicos,
contribuir para o crescimento sustentável e evitar armadilhas que possam comprometer o
seu
bem-estar. O caminho a percorrer é longo, mas com políticas públicas adequadas, um
sistema
educativo renovado e o envolvimento de toda a sociedade, é possível mudar esta
realidade.
A hora de agir é agora. O futuro económico de Portugal
depende
das escolhas que os jovens de hoje farão amanhã. E essas escolhas começam com a
educação.